Mais duas semanas de trabalho. Somente mais nove dias e mais
uma vez estarei desempregada. Como essa palavra é pesada para nós, não? Toda a minha vida eu cresci tendo a certeza
de que um diploma me traria um trabalho, que um trabalho me traria uma carreira
e uma carreira me traria felicidade.
Alguns dias de depois da minha formatura comecei a me
perguntar se aquilo realmente era verdade. Eu encontrei um bom emprego, eu
trabalhava, eu tinha dinheiro, certa estabilidade, mas alguma coisa não parecia
correta, alguma coisa sempre estava faltando. Um buraco na vida. Criei coragem
para seguir meu próprio sonho. Embarquei em uma viagem sem saber o que iria
acontecer, sem emprego. Na mala? Somente a vontade de encontrar algo para
preencher esse vazio.
Em um mês morando na Irlanda encontrei meu primeiro
trabalho. Exatamente o que eu procurava. Trabalho braçal, sem pensar muito,
ganhar, juntar e gastar dinheiro com viagens e festivais. No começo houve uma
briga interna de ego. Eu? Formada e fazendo isso? Eu tinha que contar para todo
mundo que eu estava ali somente por um tempo, que eu? Eu era formada. Então as
semanas foram passando e comecei a perceber o quanto ridícula eu estava sendo.
As pessoas que trabalhavam a vida toda ali eram meus amigos. Eu era melhor do que
eles por ter um diploma e estar ali somente por um tempo? Não. Parei de me
referir ao emprego como ‘subemprego’ porque não poderia falar disso dos meus
amigos. Parei de me justificar para mim mesma. E dai? Eu sou feliz servindo as
pessoas, fazendo café, sanduiche e limpando. E isso me faz inferior a alguém
que trabalha em um escritório? Não MESMO.
Os dias vão passando e o Brasil se aproxima. O vazio já
começou a aparecer e uma estranha angustia também. Em meio aos planos da última trip, em meio a
todo esse clima de despedida que entrei agora, eu me pego pensando –
praticamente todo dia – o que eu vou fazer da minha vida quando voltar? Essa
pergunta está me atormentando. Por um lado não posso – e não quero – voltar para
a vida antiga que tinha quando deixei tudo que tinha para trás. Aquela vida é
antiga e já não cabe mais na Juliana que volta no começo de março. Esses dias
ainda me imaginei fazendo as mesmas coisas que fazia e me deu um desespero
muito grande.
O medo da volta simplesmente me apavora. Acho que tenho medo
de voltar e ficar acomodada. Há dias tão
melancólicos que penso: por que tive a ideia de mudar de vida? Agora parece que
nada mais vai me agradar. Parece que nunca mais estarei completa, sempre
buscando coisas que não sei bem o que são em lugares ao redor do mundo.
É como se a Juliana que eu costumava ser nunca tivesse
existido. É como se eu tivesse nascido aqui, com 23 anos, sem nenhuma bagagem
social. Deixando tudo para trás, acredito que deixei até mesmo quem eu era. É
um sentimento muito forte e acredito que somente quem passa por essa experiência
é capaz de compreender. Eu me viciei. Eu me viciei em aprender, eu me viciei em coisas novas todos os dias. Eu me viciei em viver fora da zona de conforto.
O problema que quero discutir não é a minha crise
existencial, mas sim o fato de que já não sei mais o que quero fazer com a
minha vida. A palavra trabalho/carreira não faz mais sentido. Não como fazia há
algum tempo. Cheguei a fazer uma lista: mestrado? Pós-graduação? Multinacional?
Concurso público? Abrir o próprio negócio?
A última opção é a que mais mexe comigo, na realidade.
Não consigo mais trabalhar dessa forma engessada que vejo o
pessoal trabalhando. Não estou julgando,
mas talvez não seja mais para mim. Tenho conversando com vários amigos e a
sensação é a mesma para eles. Eu me formei em jornalismo, por exemplo. Dois
anos depois de formada, trabalhando já não me sentia uma. Agora? Menos ainda. E
acho isso ótimo. Porque jamais algo que apenas estudei por um tempo pode me
definir. Sou muito mais do que ‘jornalista’. Eu tenho capacidade de aprender
qualquer coisa e ser qualquer coisa que eu quiser. Sendo Doutora ou servindo
café. O que realmente importa é preencher esse vazio.
Acho mesmo que minha geração está perdida. E isso é tão bom.
Acho que enfim começamos a perceber que ir para a universidade não é o único
caminho para felicidade. Não precisamos nos encaixar porque encaixar não é mais
cool. Não para nós. Queremos algo que ainda não sabemos mas parece promissor
para mim.